Crianças compartilham o aprendizado
com outra turma
Metodologias ativas constituem abordagens pedagógicas
onde o foco do processo ensino aprendizagem está no aluno, envolvendo-o na
aprendizagem por investigação, descoberta e busca por resolução de problemas.
Precisamos entender que a aprendizagem é ativa desde
nosso nascimento. A vida é um processo de aprendizagem ativa, de enfrentamento
de desafios cada vez mais complexos. Sustentar o corpo ao dar os primeiros
passos, correr, conviver em sociedade. Todas essas fases se dão num processo de
design aberto. Aprendemos a partir de situações concretas que pouco a pouco
conseguimos ampliar e generalizar (processo indutivo), e aprendemos também a
partir de ideias ou teorias para testá-las depois no concreto (processo
dedutivo).
Aprendemos quando alguém mais experiente nos fala e
aprendemos quando descobrimos a partir de um envolvimento mais direto, por
questionamento e experimentação (a partir de perguntas, pesquisas, atividades,
projetos). As metodologias predominantes no ensino são as dedutivas o professor
transmite primeiro a teoria e depois o aluno deve aplicá-la à situação mais específica,
quando isso acontece. O que constatamos é que a aprendizagem por meio de transmissão
é importante, mas a aprendizagem por questionamento e experimentação é mais
relevante para uma compreensão mais ampla e profunda. (Moran 2015)
Ao contrário do que muita gente pensa, essa proposta de
ensino menos centrada no professor não é nova. No início do século passado, John
Dewey concebeu e colocou em prática a educação baseada no processo ativo da
busca do conhecimento pelo aluno que deveria exercer a sua liberdade no
processo de aprendizagem. Para Dewey a educação deveria formar cidadãos
competentes e criativos capazes de gerenciar sua própria liberdade. Sua
proposta era de que a aprendizagem ocorresse pela ação ou seja aprender
fazendo. (Dewey, 1944)
E não foi apenas John Dewey que pensava a educação a
partir desse prisma, em 1921 a cem milhas de Londres, na aldeia de Leiston em
Suffolk, Inglaterra, era fundada a escola Summerhill. Quando Neill e sua esposa
fundaram a escola tinham uma ideia principal de fazer com que a escola se
adaptasse às crianças em lugar de fazer com que as crianças se adaptassem à
escola. Para Neill educação deveria ser uma preparação para a vida. A escola
SummerHill governa-se pelo princípio de autonomia democrático em sua forma. Tudo
quanto se relacione com a sociedade, o grupo, a vida inclusive as punições
pelas transgressões sociais são resolvidas por votação nas assembleias gerais
da escola. Cada membro do corpo docente, cada criança independentemente da
idade que possa ter apresenta seu voto. O voto do diretor pesa tanto quanto o
de um garoto de 7 anos. No livro Liberdade sem medo, Neill relata a vivência da
escola Summer Hill que na época de sua fundação recebia crianças entre 5 a16
anos todas expulsas de escolas tradicionais. Nesse ano a escola completa 100
anos e continua sendo um modelo influente de educação progressista e
democrática em todo o mundo.
Podemos citar também Maria Montessori que transformou a
sala de aula no lugar onde as crianças eram tratadas como pessoas que queriam
aprender e eram capazes de fazê-lo no seu ritmo próprio. Rudolf Steinner que fundou
as escolas Waldorf em 1919 em Stuttgart, na Alemanha, tendo como base o
conceito de que o desenvolvimento de cada ser humano é único. Assim, o ensino deve
levar em conta as diferentes características de cada indivíduo. Um mesmo
assunto que se pretende ensinar é abordado várias vezes durante o ciclo
escolar, mas nunca da mesma maneira, e sempre respeitando a capacidade de
compreensão de cada um.
A lista não para nesses exemplos, países como Dinamarca,
Coréia do Sul e Portugal já concebem suas escolas voltadas para o estudante. A
escola da Ponte de Portugal é bem conhecida no Brasil. Mas nós temos aqui
exemplos de escolas públicas que atuam com esses princípios como é o caso da
Escola Municipal Campos Salles, em Heliópolis, na zona sul da cidade de São
Paulo. o estigma da violência, que marcava a região, é hoje insuficiente para
dar conta de uma das maiores comunidades da América Latina, reconhecida agora pelo
título de “bairro educador” pelo trabalho da Escola Municipal Campos Salles. Na
comunidade, que abriga mais de 200 mil moradores, essa transformação só foi
possível após a compreensão de que bairro e aluno são um mesmo organismo e que
precisam atuar em parceria. A nova
proposta surgiu após a escola ter sido assaltada. Ao invés de investir em
aparatos de segurança a direção decidiu derrubar os muros da escola e fechar
uma parceria com a União de Associação de Moradores (Unas). Com nova fachada,
já sem os muros físicos, a instituição elaborou ainda um novo projeto de
ensino, apresentado aos professores e membros da comunidade, e aprovado
democraticamente, garantindo que estudantes e professores trabalhem de forma
integrada, levando em conta os direitos de aprendizagem e os parâmetros curriculares,
mas, principalmente, a fala dos alunos. Assim, 12 salas de aula foram
transformadas em quatro grandes salões, onde os educandos se sentam junto com
três professores, um projeto baseado na filosofia de ensino da Escola da Ponte,
de Portugal.
Como podemos ver não faltam exemplos de práticas e nem de
educadores que há 1 século já pensavam a educação a partir do aluno, mas
precisou uma pandemia para aqui no Brasil esse tema virasse notícia nos
telejornais e nas redes sociais.
E quais são as metodologias que são utilizadas dentro
dessa abordagem pedagógica?
Vamos lá! Eu venho utilizando essa abordagem há mais de
30 anos. Durante toda minha atuação prestando consultorias para ONGs com
projetos de educação socioambientais e como professora de rede pública utilizo
essas metodologias por acreditar que o processo de aprendizagem só faz sentido
e é significativo se tiver como centro o aprendiz e seu processo de
aprendizagem. Iniciei trabalhando em uma instituição com crianças internas
vítimas de abusos e agressões. Nesse caso trabalhei com contação de histórias e
jogos. Depois usei durante a implantação de uma Oficina de Cultura, aí utilizei
da Roda de Conversa e World Café. Nas escolas trabalhando com turmas de 38
alunos trabalho muito com as metodologias carrossel, biomapa, jogos, histórias
e vou adaptando para minha realidade. Trabalho o projeto vida através da
educação socioemocional.
Vamos entender um pouco como são algumas dessas
metodologias.
Aprendizagem personalizada
É um movimento de construção de trilhas que façam sentido
para cada estudante, que os motivem a aprender, que respeitem os seus limites,
que os levem ao processo de serem mais livres e consequentemente mais
autônomos. Nessa aprendizagem o professor vai ao encontro das necessidades e interesses
de seus estudantes buscando ajudá-los a desenvolver o seu potencial, ajudando
os a entender o significado do seu processo de aprendizagem.
Há diversas formas
para desenvolver esse método.
Uma
delas é planejar atividades diferentes para que os alunos aprendam de várias
formas. A Rotação Por Estações é um exemplo dessa forma e é a que eu uso
com mais frequência, adaptando para minha realidade.
Uma
outra forma é desenhar o mesmo roteiro básico para todos os alunos e permitir
que eles executem no seu próprio ritmo realizando avaliação quando se sentirem
prontos e podendo refazer esse percurso. Eu particularmente acho essa segunda
forma mais complexa para desenvolver numa turma de ensino público onde
precisamos seguir alinhados com as avaliações da rede.
Uma
outra forma de personalização e colocar os alunos numa plataforma adaptativa
como a Khan Academy em matemática, e acompanhar as suas atividades online,
percebendo o grau de domínio em alguns temas em relação a outros, e organizando
atividades de apoio de acordo com a necessidade observadas na visualização
online.
A
Personalização é um processo complexo, que exige maturidade e autonomia
crescente dos estudantes e também docentes muito bem-preparados e remunerados,
bom apoio institucional e infraestrutura tecnológica. Os professores precisam
descobrir quais são as motivações fundamentais de cada estudante, o que os
mobiliza a aprender, os percursos, técnicas e tecnologias mais adequadas para
cada situação e combinar equilibradamente atividades individuais e grupais,
presenciais e online“ (Moran,
2015.p.6)
Esse é o grande desafio da aprendizagem personalizada nas
redes públicas do Brasil.
Aprendizagem personalizada a partir do
Projeto de Vida
A personalização encontra seu sentido mais profundo
quando cada estudante se conhece melhor e amplia a percepção do seu potencial
em todas as dimensões. o projeto de vida é um componente curricular transversal
que visa promover a convergência de um lado entre os interesses e paixões de
cada aluno e de outro entre seus talentos histórias e contextos.
Estimula-se a busca de trilhas de vida com significado
útil pessoal e socialmente e, como consequência, pretende-se ampliar a
motivação profunda para aprender e evoluir em todas as dimensões. São trilhas
pessoais de vida porque elas se refazem, redefinem, modificam com o tempo. São
projetos porque estão em construção e tem dinâmicas que ajudam a rever o
passado a situar-se no presente e a projetar algumas dimensões do futuro.
Os projetos de vida olham para o passado a história de
cada aluno para o seu contexto atual e para a suas expectativas futuras.
(Moran, 2015)
Eu utilizo de outros métodos alinhados ao Projeto de Vida,
como trabalhar com o Mindset das crianças, educação socioemocional e disciplina
positiva. Assim trabalho questões relacionadas a vida de cada um os meus estudantes,
e dessa forma vamos avançando no aprendizado, diminuindo e até eliminando
questões referentes a indisciplina, fazendo com que a turma caminhe mais unida
e as crianças mais fortalecidas na sua individualidade, se tornando mais
autônomas.
Aprendizagem compartilhada
O segundo movimento importante para aprender acontece
pelas múltiplas possibilidades de encontros com pessoas próximas e distantes
que se agrupam de forma mais aberta ou organizada, pontual ou permanente,
formal ou informal.
Segundo a neurociência, nosso cérebro aprende
conectando-se em rede. Todas as iniciativas para abrir os espaços das escolas
para o mundo, ampliando as diferentes redes sociais, tecnológicas, pessoais,
grupais e institucionais, contribuem para oferecer ricas oportunidades de
aprendizagem.
O mundo da cocriação, do coworking, da economia criativa,
do design colaborativo e da cultura maker comprova a força da colaboração, do
compartilhamento, da sinergia para descobrir soluções.
Ganha importância na educação formal o contato com
entornos reais, com problemas concretos da comunidade, não somente para
conhecê-los, mas para procurar contribuir com soluções reais, a partir de
processos de empatia, de aproximação, de escuta e de compartilhamento.
Durante os anos em que atuo na rede pública desenvolvi
junto aos meus estudantes um projeto de cartas onde eles trocam cartas com
estudantes de outras escolas do município e até de outro país, como ocorreu com
alunos da Colômbia. As crianças puderam trocar correspondências, mapas, fotos e
objetos, finalizando com a visita a nossa escola de três estudantes colombianas
do curso de graduação em pedagogia. Foi um projeto extremamente rico.
Outro projeto que também trabalho com as crianças é a
construção do biomapa, em que elas aprofundam o olhar para a sua comunidade
destacando a partir de imagens satélites, os pontos fortes e as fragilidades.
Para fazer um resgate histórico, convido um morador antigo que pode ser um avô,
tio ou alguém da própria comunidade escolar para conversar com as crianças
sobre o bairro e suas transformações através dos tempos.
Aprendizagem por
tutoria
O terceiro movimento na aprendizagem acontece no contato
com profissionais mais experientes, professores, tutores e mentores. Eles podem
ajudar os estudantes a ir além de onde se chegariam se fossem sozinhos.
Desempenham o papel de curadores para que cada estudante avance mais na
aprendizagem individualizada.
Os bons professores e orientadores sempre foram e serão
fundamentais para avançar na aprendizagem. Eles ajudam a desenhar roteiros
interessantes, problematizam, orientam, ampliam questões, os caminhos a serem
percorridos. O diferente hoje é que eles não precisam estar o tempo todo junto
com os alunos, nem precisam estar explicando as informações para todos. Moran,
2015
Algumas técnicas para a aprendizagem ativa
As 4 fases da metodologia baseada em
problemas são:
Identificação dos problemas - formulação de hipótese,
identificação de temas
Exploração
- investigação sobre as causas do problema
Resolução do problema - a busca de solução
Avaliação
Muitas pessoas confundem as metodologias baseadas em
projetos com as baseadas em problemas.
O foco da metodologia baseada em problema é a pesquisa de
diversas causas possíveis para um problema enquanto na aprendizagem baseada em
projetos procura-se uma solução específica, que se desdobra na elaboração de um
projeto para resolver uma questão ou problema. Na prática há grande
inter-relação. A baseada em problema tem
como inspiração os princípios da escola ativa, do método científico, de um
ensino integrado e integrador dos conteúdos, dos ciclos de conteúdo, onde o
aluno aprende a aprender e se prepara para resolver problemas.
Aprendizagem baseada em projetos
É uma metodologia de aprendizagem em que os alunos se
envolvem com tarefas e desafios para resolver um problema ou desenvolver um
projeto que tenha ligação com sua vida fora da sala de aula. De acordo com o
Buck Institute for Education (2008), os projetos que se apresentam como
efetivos tem os seguintes atributos:
reconhecem
o impulso para aprender intrínseco no dos alunos;
envolvem
os alunos os conceitos e princípios centrais de uma disciplina;
destacam
questões provocativas;
requerem
a utilização de ferramentas e habilidades essenciais incluindo tecnologias para
aprendizagem autogestão e gestão do projeto;
especificam
produtos que resolvem problemas;
inclui
múltiplos produtos que permitem feedback;
utilizam
avaliações baseadas em desempenho;
estimulam
algumas formas de cooperação.
São vários os modelos de
implementação de metodologia de projetos que podem variar de curta duração (uma
ou 2 semanas), restritos ao âmbito da sala de aula, até projetos de soluções
mais complexas que envolvem temas transversais com duração mais longa.
Os principais modelos são:
exercício-projeto:
quando aplicado no âmbito de uma única disciplina;
componente-projeto:
quando é desenvolvido de modo independente das disciplinas;
abordagem-projeto:
quando se apresenta como uma atividade interdisciplinar;
currículo-projeto:
quando não mais é possível identificar uma estrutura formada por disciplinas
pois todas elas se desenvolvem e seus conteúdos passam a estar a serviço do
projeto e vice-versa.
Aprendizagem por histórias e jogos
Deste sempre uma das formas mais eficientes de
aprendizagem é a que acontece por meio de histórias contadas (narrativas), e
histórias em ação (histórias de vidas e compartilhadas).
Contar, criar e compartilhar histórias é hoje muito
fácil. Podemos usar aplicativos ou podemos criar livros que podem ser
compartilhados entre as crianças de outras turmas.
Eu particularmente invisto muito na criação de histórias
para trabalhar conteúdos mais complexos e também para trabalhar a educação
socioemocional.
Já os jogos e as aulas roteirizadas com a linguagem de
jogos (gamificação) estão cada vez mais presentes na escola e são estratégias
importantes de encantamento e motivação para aprendizagem mais rápida e próximo
da vida real.
As metodologias ativas são caminhos para avançar quando das competências socioemocionais e em novas práticas. E o nosso papel de professor é muito mais amplo e complexo. Não está centrado somente em transmitir informações de uma área específica, mas principalmente sermos designer de roteiros personalizados e grupais de aprendizagem.
Ensinar
não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria
produção ou a sua construção Paulo
Freire, 2003.p.47
Estamos vivendo um momento único para nossa geração.
Estamos há um ano convivendo com as mudanças sociais impostas pela pandemia
provocada pela COVID-19. Escolas foram fechadas por todo o país e as aulas
passaram a ser online.
Os novos protocolos de saúde apontam para um eventual
retorno gradual, com turmas menores, em uma espécie de rodízio de alunos.
Diante desse novo quadro se faz necessário repensar um
ensino que aconteça na escola e ao mesmo tempo nas casas dos estudantes de
forma online. Faz-se necessário repensar um modelo educacional que busque um
currículo integrado às novas tecnologias e novas metodologias. E é a partir
dessa realidade que o termo “ensino híbrido” vem ganhando as redes sociais e as
reuniões pedagógicas. Mas o que é “ensino híbrido”?
O termo [i]híbrido
significa, segundo o dicionário Priberam, “que ou o que tem elementos
diferentes em sua composição.”
Mas ensino híbrido não é apenas a mistura de dois
elementos – ensino em casa e ensino na escola – e sim uma abordagem pedagógica
que apresenta diferentes metodologias e que traz na sua essência o estudante como
foco no processo de ensino e aprendizagem. Nessa proposta pedagógica não há
mais a tradicional transmissão de conhecimento por parte do professor e sim uma
construção conjunta. (Valente, 2015)
Essa abordagem já vem sendo apresentada por vários
educadores há anos, como Montessori (1909), Rudolf Steinner (1919) e Paulo Freire
(1950) entre outros que acreditam numa educação que tenha o estudante como
protagonista dentro do processo ensino-aprendizagem. A BNCC, homologada em 2017,
apresenta um compromisso com a educação integral e já aponta para o estudante
como sujeito do processo educacional.
O contexto pandêmico forçou a sociedade a rever o
processo de ensino-aprendizagem e o ensino híbrido vem ganhando força.
Nessa proposta não há um detentor do saber, que é fluido
entre educador e educando. O conhecimento pula o muro da escola e ganha vida
nas relações estabelecidas pelo estudante que sai do papel de mero receptor de
informação para o papel de produtor de seu próprio saber. Aqui o estudante
define o tema a ser estudado e busca as informações ganhando autonomia. O
professor sai do papel de transmissor do saber para o papel de mediador desse
processo.
Com o isolamento social a educação passou a utilizar o modelo
disruptivo – As aulas estão acontecendo a distância. O que no ensino básico
exige um esforço conjunto entre gestão escolar, professor, estudante e
responsáveis. Do lado da escola, se faz necessário disponibilizar material para
os estudantes, elaborar videoaulas dinâmicas, que envolvam e despertem a
atenção das crianças. Do lado do estudante se faz necessário que a família
garanta um espaço e um tempo para que a criança possa participar das aulas e
realizar as atividades.
Com a possibilidade de reabertura das escolas, o ensino híbrido
tomou força no Brasil. Porém já existem escolas que vinham desenvolvendo o ensino
híbrido antes da pandemia. Com as aulas acontecendo unicamente no espaço
escolar, que disponibiliza espaços múltiplos como laboratório rotacional, salas
de leituras, de informática, espaço de convivência, mobiliário flexível e proposta
pedagógica que envolve metodologias[ii]diferenciadas como:
Laboratório Rotacional
Sala de aula invertida
Rotação individual
Ensino baseado em projetos
Aqui híbrido é misturar, juntar, flexibilizar
circunstâncias para que o estudante possa construir seu aprendizado a partir de
sua individualidade.
Para que esse artigo não se transforme em um livro, sintetizarei
os principais conceitos dessa proposta.
Valores desse modelo
Respeitar
a individualidade de cada estudante, que terá seu próprio ritmo de ensino.
Incentivar
o protagonismo do estudante.
Colocar
o professor no papel de mediador – O que favorece uma maior troca com o
estudante e uma maior aprendizagem de ambos.
Mudar
a cultura de avaliação, que passa a ter uma participação direta do aluno com a
autoavaliação.
Oferecer
espaço para constante troca no processo com o estudante atuando em grupos
mediados pelo professor.
Características
A
proposta pedagógica é construída de forma conjunta entre gestores, pais e
professores num espaço onde há uma escuta ativa de todos os envolvidos
incluindo os estudantes que constroem o seu plano de estudo.
O
estudante ter contado com as informações antes de entrar em sala de aula,
através de pesquisas, projetos...
O
estudante pode trabalhar com o material no seu ritmo, tentando desenvolver o
máximo de compreensão possível.
O
estudante é incentivado a ser mais autônomo e a se preparar para aula,
realizando pesquisas, tarefas e autoavaliação.
O
resultado da autoavaliação, trabalhada antes da sala de aula, é um bom
indicador do nível de preparo do aluno.
O estudante se prepara antes do encontro presencial, fazendo com que o tempo da aula seja dedicado ao aprofundamento da sua compreensão acerca do conhecimento construído.
O currículo é mais flexível, com um planejamento do que é básico e fundamental para todos e, ao mesmo tempo, permitindo caminhos personalizados atendendo a necessidade de cada estudante.
Possibilita a articulação de processos de ensino e aprendizagem mais formais com aqueles informais, de educação aberta e em rede. Implica misturar e integrar áreas, profissionais e alunos diferentes, em espaços e tempos diferentes.
O Ensino Híbrido funciona como uma engrenagem, onde cada peça é importante dentro do processo que tem o estudante como centro. Esse será um dos desafios dessa proposta. Quebrar os paradigmas de papéis há séculos definidos.
Um outro desafio é estarmos falando de um país com grande desigualdade social, com muitas crianças vindas de lares desestruturados e onde muitas escolas e muitos estudantes não possuem acesso a tecnologia. Esse é o “nosso chão” e é desse lugar que teremos que partir.
Eu particularmente bebo dessa fonte há anos e busco dentro do meu exercício de educadora oferecer ferramentas para que meus educandos percebam que podem assumir o seu protagonismo. A sala de aula dentro do desenho original limita e muito esse processo.
Eu acredito ser sim possível essa proposta acontecer nas escolas públicas, mas não será de uma hora para outra. Acredito que teremos que passar por um processo que vai envolver quebras de paradigmas e exigir transformações dos atores envolvidos.
Estamos passando por uma mudança cultural com uma transformação do contexto escolar da era industrial, onde o ensino era padronizado e oferecido a crianças diferentes, onde o ritmo de aprendizagem era determinado pelo relógio e as crianças agrupadas por faixa etária, para a era digital, com espaços múltiplos e estudantes autônomos. Essa mudança exige coparticipação, compartilhamento e interatividade.
Nossas crianças levarão um tempo para entender essas mudanças e incorporar o seu protagonismo, afinal estão há anos sendo doutrinadas a ficar sentadas em carteiras enfileiradas sem direito de fala. Precisarão de um tempo para entender que liberdade não é bagunça.
Os professores precisarão de um tempo para rever sua concepção de ensino, de entender que seu papel deixará de ser o de quem detém o saber, para quem faz a mediação da construção de múltiplos saberes. E isso vai exigir sair da zona de conforto proposta por um planejamento fechado e centrado em uma única fonte de conhecimento.
Os responsáveis levarão um tempo para assimilar que eles também fazem parte desse processo e que precisarão garantir espaço e tempo dentro de suas casas para que as crianças possam acessar os materiais.
As salas de aulas terão que ter números menos de estudantes, desenvolver metodologias participativas com turmas de 40 estudantes é um desafio muito grande.
Mas estamos num momento de mudanças e a escola do século XXI não pode continuar atrelada a conceitos e métodos do século XIX.
Nesse novo século somo todos aprendizes e mestres, consumidores e produtores de informação e de conhecimento. E a escola está a refletir toda essa transformação.
5 dicas
de atividades para receber os alunos na volta às aulas
“De toda verdade que não é
acompanhada por um riso, pelo menos deveríamos dizer que é falsa. ”Friedrich Nietzsche
Para quem é professor a volta as
aulas sempre chega com um gostinho todo especial. É o velho “começar de novo... “ E o novo sempre encanta... Quem não gosta de comprar novos
materiais?
Eu particularmente me abasteço de post-it e
canetas coloridas, um caderno de planejamento novinho e recém-decorado...
Agenda, planilhas, pastas...
Na sala uma decoração que acolhe,
que diz para quem chega, que ali é o “seu lugar”. Novos olhares, novas
histórias... Uma nova turma sempre desperta o melhor de mim. O desafio de
memorizar rapidamente 38, 40 nomes, de conhecer um pouquinho que seja de cada
aluno, de elaborar um plano de aula respeitando as potencialidades e
dificuldades de cada um dos 40 alunos. Muito a descobrir dentro de um curto
espaço de tempo. Mas sabemos que daremos conta. Afinal é o velho “começar de
novo”.
Nesse ano de 2021 essa fase
chegou agregada de novos medos e também novos valores. Ainda estamos em uma pandemia. Há quem deseja
voltar para a escola e há quem gostaria de esperar pela vacina. Medo, incerteza
e o velho “começar de novo” que chega de um jeito todo diferente. Um retorno
que nunca foi tão incerto.
Voltaremos com o Ensino Híbrido.
Mas afinal o que é isso?
Olhando
no dicionário encontraremos as definições: Híbrido
-
Que ou o que tem elementos diferentes em sua composição.
-
Diz-se de ou animal proveniente de duas espécies diferentes (ex.: a mula é
animal híbrido).
Tenho muito a falar sobre o
sentido de Híbrido na educação, mas deixarei para um próximo post. Hoje irei me
deter ao conceito de que teremos um “ensino híbrido” no sentido de misturar
dois elementos no processo educacional: Criança estudando em sala de aula e em
casa.
E foi pensando nisso que
desenvolvi o meu planejamento de retorno e acolhimento.
Aqui compartilharei algumas
atividades que poderão ser desenvolvidas com os estudantes em sala ou em suas
casas.
Tem muitas outras e a internet está repleta de boas dicas. Eu selecionei aqui as que tenho utilizado por serem atividade que servem de ponto de partida para que eu possa trabalhar a educação socioemocional.
Espero que gostem! Se desenvolverem alguma dessas atividades compartilhe aqui como foi! Dúvidas mande suas questões por aqui ou em alguma das minhas redes sociais.
Beijos nos corações! E vamos seguir fortalecidos na certeza de buscar fazer o nosso melhor a cada dia.
Bibliografia: Conceito de "híbrido", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/h%C3%ADbrido [consultado em 05-02-2021].
Vamos lá:
Atividade 1
Árvore dos Sonhos
Eu venho utilizando essa
atividade há anos nos processos de formação com professores, nos projetos de
reconstrução de um território e em sala de aula. A Árvore dos Sonhos faz parte
de uma dinâmica chamada Oficina do Futuro.
Para sala de aula eu fiz algumas
pequenas modificações.
Você vai precisar confeccionar:
A Árvore dos Sonhos: Poderá usar papel pardo
como base e cartolina colorida para o tronco, galhos, raiz. Ou TNT (que é o que
eu uso, pois, a árvore fica mais durável).
Para as folhas, papel de preferência verde,
amarelo ou rosa recortado no formato de folhas. (Eu uso o chameguinho colorido)
Num primeiro momento apresente a árvore para as crianças e
pergunte o que elas estão vendo?
Ouça e questione, caso ninguém fale, o que falta na árvore?
Depois complete dizendo que essa árvore está assim porque
ela é uma árvore especial. Que ela é a Árvore dos Sonhos. E que as folhas estão
faltando pois será justamente nela que cada um da sala vai escrever os seus
sonhos. Converse então sobre sonhos... Explique que sonhos são desejos que
temos... Distribua uma folha para cada criança e peça que elas escrevam o que
elas desejam para esse novo ano. Dê um tempo para que escrevam e depois peça
que cada criança vá uma por vez colar (use fita crepe) o seu sonho na árvore.
Incentive que cada uma compartilhe com a turma o seu sonho e diga, que assim
todos estarão unidos pelos sonhos. Mas respeite os que não se sentirem à
vontade para falar e caso a criança permita você pode ler o sonho dela. Não
permita que ocorram risadas... se isso acontecer converse sobre a importância
de respeitar e acolher a fala dos colegas. Diga que você nunca irá rir de uma
fala deles e que sempre estará aberta para ouvi-los de forma respeitosa e que
assim deverá ser o comportamento deles em sua sala.
Após todos terem colados as
folhas, chame a atenção para a raiz da árvore.
Para que serve a raiz? Para que a
árvore puxe nutrientes do Solo. Para dar força a árvore.
Entregue para as crianças pedaços
de papel no formato de raiz e peça que escrevam quem dá força para elas. Deixe
claro que essa força é o que nos mantém firmes para realizar os nossos sonhos.
Dê um tempo para escreverem e
peça que colem na árvore as raízes.
Depois leia todos os sonhos e vá
fazendo comentários de incentivo, faça apontamentos positivos de todos os
sonhos e depois das raízes.
Em todos os anos que desenvolvi essa atividade
com crianças elas colocam a família e Deus como sendo a raiz e os sonhos variam
entre desejo pessoal a desejos humanitários. Fale que a árvore é uma
representação da turma e revela o quanto bonita a turma é. Fale um pouco de
valores e de virtudes. Fale de empatia, do cuidado com o outro. Afinal agora
somos todos uma única árvore. A abordagem vai depender da faixa etária. Eu já
fiz com crianças de 6 anos e nesse caso elas desenharam como já fiz com
adolescentes que estavam num projeto para menores que cumpriam medida
socioeducativa. Ou seja, funciona!
Finalize dizendo que você vai se
dedicar para que cada um caminhe um pouco mais no sentido de alcançar o sonho,
pois o estudo é a mola que irá impulsioná-los a essa realização.
Deixe a árvore na sala e use-a
como referência para conversar comportamento. Se a turma não está participando,
chame a atenção para os sonhos... Eu falo: Não é com brigas e com falta de
respeitos que seremos médicos, jogador de futebol... que teremos paz no
mundo... Cito alguns dos sonhos. Isso ajuda a criança compreender a relação do
estudo com sua vida. Nas reuniões de pais eu mostro a árvore, leio alguns dos
sonhos e eles podem se aproximar para ler o sonho do filho. E chamo a atenção
para o papel que eles têm na sustentação desses sonhos.
As crianças criam uma conexão com
a árvore, sempre voltam nela para reler seu sonho ou os sonhos dos colegas.
Atividade 2
Cápsula do tempo
Tempo, Tempo, Tempo... Quem se dá
conta do tempo?
A Pedra Fundamental é o nome que
se dá ao primeiro bloco de pedra ou alvenaria acima de uma fundação de uma
construção. Durante uma cerimônia simbólica, a colocação da pedra fundamental
significa o início efetivo de uma edificação. Segundo o Dicionário Houaiss da
língua portuguesa (1.ª edição/2001), a Pedra fundamental "assinala,
geralmente com solenidade, o início de uma obra importante". Também é
costume se adicionar uma cápsula do tempo, recipiente fechado
contendo uma ata com o nome das pessoas presentes e lembranças do dia, como um
jornal ou moedas, para a posteridade. A pedra fundamental, contendo inscrições
como data e identificação do construtor, tradicionalmente é encontrada no canto
nordeste da construção.
O ator Dan Stulbach concedeu uma
entrevista no programa do Jô Soares em que leu uma carta que havia escrito para
si mesmo quando tinha 16 anos. Essa carta foi guardada em sua “capsula do
tempo” e foi lida durante o recebimento
de uma premiação teatral. Muito fofo! Vale assistir ao vídeo.
Bom, e para marcar o início do
ano letivo, você pode construir uma capsula do tempo com seus estudantes.
Se já estiver no presencial, peça
que as crianças levem para a escola no primeiro dia de aula uma garrafa pet, ou
um pote de margarina, de creme de cabelo. Qualquer recipiente de plástico. Eu
já vou juntando e levo uma boa quantidade, pois sabemos que sempre terá uma ou
outra criança que não levará. Algumas professoras usam vidro, mas prefiro não
arriscar a ter um vidro espatifando no meio de minha sala.
Se ainda estiver no online, peça
que a criança separe esse recipiente para o primeiro encontro na plataforma
virtual.
Converse sobre a importância
desse momento, onde vocês estão se conhecendo, caso você ainda não conheça a
turma, e sobre a importância de ser um novo ano letivo. Onde estudaremos de um
jeito diferente. Explique que por ser um momento único vocês irão marcar esse
momento com uma Capsula do Tempo. Pergunte se já ouviram falar sobre a capsula
do tempo e explique como vocês farão a de vocês.
Identifique o recipiente com um
cartão escrito “Cápsula do Tempo”. Se for em sala já leve essa identificação
para que as crianças completem com nome e pintem.
O conteúdo pode ficar a seu
critério.
As crianças podem escrever desejos para o ano
letivo, propor metas, colocar dados como peso e altura. Eu costumo levar uma
balança e uma fita métrica para pesar e medir os pequenos. Já consegue imaginar
a festa? Também gosto de fazer uma foto de cada um e imprimir. Cada criança
coloca sua foto e no final do ano é possível ver as transformações.
Depois de tudo devidamente
armazenado na capsula ela é fechada e só será aberta no final do ano letivo.
Essa atividade pode ser realizada
em sala de aula ou em casa.
Você vai precisar imprimir o
modelo do desenho do celular, onde a criança irá fazer desenhos de momentos que
foram importantes em suas férias. Após desenhar e pintar os momentos selecionados são
compartilhados com os colegas.
Eu uso essa atividade
semanalmente, mas a apresento para a turma na primeira semana de aula.
Em um papel pardo, desenhe um
termômetro de aproximadamente 60 cm. Divida-o ao meio e pinte cada metade de
uma cor e numere de 1 a 10 numa escala crescente. Cole esse termômetro em um
lugar visível dentro da sala
Apresente o termômetro para
criança conversando sobre a função dos termômetros que na maioria das vezes
elas já conhecem.
Explique que esse é um termômetro especial e que será utilizado
para medir a disposição para estudar. Fale que é importante a criança pensar
sobre isso. E que é comum ter alguns dias em que não estamos muito bem...
Nesses dias precisamos contar com os amigos e com a professora para nos
motivar.
Cada criança recebe um pedaço de
papel onde deverão escrever seus nomes. Depois cada uma cola com fita crepe seu
nome no grau de sua disposição para estudo.
Converse sobre o resultado, deixe
a criança a vontade para colocar negativo e pergunte se ela quer conversar
sobre o porquê da indisposição para o estudo. Respeite a posição de cada
criança. No decorrer dos dias ao iniciar a aula peça para que as crianças
alterem se for necessário o seu lugar no termômetro.
Em um outro post falarei mais
sobre essa atividade como medidor de emoções e como com essa atividade tão
simples conseguimos medir o impacto de nossa aula sobre os pequenos.
O objetivo dessa atividade é
traçar com a turma uma meta em comum. Assim como numa corrida, precisaremos
percorrer um caminho.
Temos uma meta para atingir e um lugar para chegar.
Desenhe uma estrada utilizando de
cartolina preta e faça a marcação da pista com papel amarelo. Eu normalmente
faço uma estrada em torno de 1 metro de
comprimento.
Explique o que é uma meta e vá juntamente com os
alunos definindo qual seria a meta da turma.
Perguntas como:
O que desejamos enquanto turma para esse ano?
Como queremos chegar no final do ano? Com notas
boas? Ou com notas ruins?
Queremos aprender a matéria?
Queremos melhorar nossa leitura?
Uma vez definido o destino, converse com a turma quais
seriam os desvios que não pode ser pego. Que placas irão aparecer para desviar
o corretor da estrada?
Exemplo:
Falar durante a explicação
da professora, pode nos desviar de aprender bem a matéria e tirar boas
notas? Se sim, esse seria um desvio.
Brigas entre colegas.
Chegar atrasado para a
aula;
Não fazer as atividades em
casa.
A meta deve ser escrita em uma tarjeta e colada no topo da
estrada e os desvios em setas desenhadas em papel e coladas na lateral. Deixe
sua estrada em um lugar bem visível e converse sobre ela sempre que sentir que
a turma está pegando muito desvio.
Jornada do
autoconhecimento Como tomar
a vida nas próprias mãos
Gleice Máira Alves
NOSSO caminho
se revela como um destino? Algo que cai sobre nós, vindo de fora, de algum
lugar que desconhecemos? Algo imutável que não podemos escapar?
A ciência nos
revela que não! Aos olhos da ciência, podemos sim mudar e definir nossa forma
de estar no mundo. Podemos decidir qual caminho seguir, quais frutos colher e
quais sementes semear.
Mas para que
possamos tomar essas decisões, primeiro precisamos percorrer o caminho de
dentro de nossa alma. Desvendar os medos e a força de nosso coração. Precisamos
conhecer nossa biografia, entender o porquê de alguns acontecimentos. Dessa
forma compreenderemos os porquês das lacunas, como superá-las e realmente
definir a tônica de nossa vida.
Para Gudrun
(2000), “Nossa biografia é tal qual um rio que pode fazer vários percursos
escolhendo o terreno que poderá melhor fluir”.
Não somos
marionetes do destino, não somos um carro desgovernado. Quando paramos para
refletir sobre nossa biografia, sobre nossa história, aprendemos a pegar o
volante de forma assertiva e segura, conduzindo o carro pelo caminho por nós
escolhido.
Cada um de nós
traz um
questionamento cuja resposta está em nossa biografia. Uma história única, que
contém as respostas para as inquietações, medos e ansiedades.
Forjando a Armadura
Nego-me a me submeter ao
medo que me tira a alegria de minha liberdade,
que não me deixa arriscar
nada, que me torna pequeno e mesquinho, que me amarra,
que não me deixa ser direto
e franco,
que me persegue,
que ocupa negativamente
minha imaginação, que sempre pinta visses sombrias.
No entanto não quero
levantar barricadas por medo do medo.
Eu quero viver, e não quero
encerrar-me. Não quero ser amigável por ter medo de ser sincero.
Quero pisar firme porque
estou seguro e não para encobrir meu medo.
E, quando me calo, quero
fazê-lo por amor e não por temer as consequências de minhas palavras.
Não quero acreditar em algo
só pelo medo de não acreditar.
Não quero filosofar por medo
que algo possa atingir-me de perto.
Não quero dobrar-me só
porque tenho medo de não ser amável.
Não quero impor algo aos
outros pelo medo de que possam impor algo a mim;
por medo de errar, não quero
tornar-me inativo.
Não quero fugir de volta
para o velho, o inaceitável, por medo de não me sentir seguro no novo.
Não quero fazer-me de
importante porque tenho medo de que senão poderia ser ignorado.
Por convicção e amor, quero
fazer o que faço e deixar de fazer o que deixo de fazer.
Do medo quero arrancar o
domínio e dá-lo ao amor. E quero crer no reino que existe em mim”
(Rudolf Steiner)
Durante as oficinas “Aprender da Vida” que desenvolvo
com educadores e professores, proponho como primeira atividade a construção de
sua Linha da Vida. Acredito que só conseguiremos propor transformações
efetivas dentro do processo educacional, se primeiro percorremos o caminho de
nosso autodesenvolvimento.
Nós professores
precisamos trabalhar nossas emoções e desenvolvimento para só então estarmos
prontos para mediar o desenvolvimento do outro. Pois a nossa luz ficará por
onde passamos e refletirá nas pessoas com as quais convivemos. Somos capazes de
propor transformações nas vidas das pessoas que compartilham de nossa vivência.
Nesse
artigo compartilho com você a minha linha da vida, realizada durante uma
oficina de desenvolvimento pessoal - orientada pela Pedagogia Social, com base
Antroposófica, que aconteceu em 2008 no meio da Amazônia. Foram 3 encontros com
duração de 7 dias cada, em total imersão, nem celular pegava no hotel onde
ficamos. O objetivo da oficina foi o de fortalecer e aprimorar a profissionalização
dos educadores socioambientais. E eu tive o prazer de ter sido selecionada para
passar por essa experiência.
Dividindo rapidamente com você minha biografia, te convido a
mergulhar na sua. E a conhecer, se ainda não conhece, alguns pensadores da
educação, que muito contribuem para a nossa jornada interior.
Atividade: Construção da Linha da Vida
Essa atividade propõe um olhar reflexivo para nossa história
de vida. Do nascimento até os dias atuais.
Vale lembrar que se você estiver se sentindo muito fragilizada/o
e angustiada/o, o recomendável é que busque imediatamente a orientação de um
profissional como terapeutas e psicólogos. Entrar em contato com lembranças que
nem sempre são agradáveis podem te levar a um quadro depressivo.
Mas se você estiver
bem, te convido a fazer um passeio pela mais bela e intensa estrada já
percorrida: a estrada de sua história de vida.
Pegue uma folha de papel, lápis, canetas coloridas, lápis de
cor e giz de cera. Vá para um lugar tranquilo, onde ninguém irá lhe
interromper. Se possível entre em contato com a natureza. Respire, desperte
seus sentidos. Sinta os aromas, ouça os sons e observe a vida que existe ao seu
redor. Se estiver em casa, coloque uma música instrumental.
Na folha você vai traçar uma linha que pode ser reta,
sinuosa ou em forma de caracol. Não pense na forma, apenas pegue o lápis e faça
a sua linha.
No início coloque o ano de seu nascimento. E inicie a sua
viagem. Deixe que as lembranças da infância venham e vá colocando na linha os
acontecimentos e pessoas que foram marcantes naquele período. Não é para
escrever um texto grande, na linha marque apenas 1 ou 2 palavras que pontuem
aquele momento. Ao lado se sentir vontade, escreva um pouco sobre esse
acontecimento. Vá seguindo a linha, se lembrar as datas use-as como marcador.
Caso não se lembre marque com palavras como nome de cidades. O importante é que
você coloque na sua linha fatos e pessoas que foram decisivos na sua história.
Aqui o mais importante é que essas lembranças venham com as
emoções e que lhe proporcione sentir... Às vezes sentirá alegria, dores, medos.
Tente sentir gratidão. Pois essa é a sua história. Não queira racionalizar.
Apenas se permita sentir... Você vai perceber emoções que há muito estavam
adormecidas. Use as canetas e os lápis de cor para colorir sua folha.
Guarde-a e passe a olhá-la com frequência no decorrer dos
dias. Vá refletindo sobre os acontecimentos destacados por você. Reflita sobre
as dores e alegrias de ser quem você se tornou.
Dentre todas as metodologias que
estudei, a Pedagogia Social é uma das que mais desenvolvo na minha atuação como
educadora socioambiental e professora do ensino fundamental II. Durante os 38
anos em que atuo na educação interagi com crianças que apresentam alguma
dificuldade de aprendizagem, crianças e jovens em situação de vulnerabilidade
e/ou com dificuldade de socialização, mulheres, mães, educadoras, professoras,
pescadores, agricultores, caiçaras... Minha vida se construiu nas relações com
pessoas nas mais diversas faixas-etárias, dos mais diversos cantos do Brasil.
Essa troca de saberes e de vivências me fortaleceu durante a minha jornada
pessoal que desenvolvi através de ensinamentos de educadores como Carl Rogers,
Rudolf Steiner e Rubens Alves.
Pedagogia
Social
Pedagogia Social significa
"agir sobre si mesmo, com os outros e com as perguntas da sociedade, de
tal forma que nossa ação torne possível o desenvolvimento sadio de outras
pessoas e das condições sociais." (Bos, 2004)
Como pessoas, somos responsáveis
pela organização da nossa vida social. É da qualidade desta vida social – seja
em nível do relacionamento interpessoal, da vida institucional numa organização
ou da sociedade como um todo – que depende o maior ou menor bem-estar da totalidade
dos indivíduos que dela fazem parte.
Como indivíduos, contribuímos com nossos pensamentos, julgamentos e
atitudes para a criação do ambiente social em que vivemos, ao mesmo tempo em
que estas também afetam nosso próprio bem-estar. Isso nos mostra que a qualidade
da vida social resulta da interação entre fatores provenientes do próprio
indivíduo e das relações sociais por ele criadas.
O fenômeno do desenvolvimento é
uma manifestação da própria vida. E a compreensão do fenômeno do
desenvolvimento só é possível mediante a compreensão das leis que regem a vida.
Rudolf Steiner, fundador da Antroposofia, sem dúvida um dos maiores pensadores
e personalidades do nosso século, mesmo que relativamente ainda pouco
conhecido, trouxe uma contribuição fundamental para a compreensão destas leis.
Uma aplicação das ideias de
Rudolf Steiner sobre organização social, a Pedagogia Social foi por ele formulada
em 1919 com o nome de "Trimembração do Organismo Social"
("Dreigliederung des Sozialen Organismus"), no âmbito de grandes ou
pequenos grupos sociais (como empresas ou grupos de trabalho) e também do
âmbito do desenvolvimento de sensibilidade, responsabilidade e ação sociais
individuais.
Do ponto de vista metodológico, educação
com bases antroposóficas ou a Pedagogia Social evita as atividades fechadas em
grades ou projetos (com data de início e data de término) e privilegia os
chamados processos (que têm data de início, mas não de término). Isso não quer
dizer que não existam objetivos, organização, prazos, orçamentos etc. Mas quer
dizer que se privilegia o desenvolvimento das pessoas e não o seu adestramento
numa determinada tarefa. A abordagem é muito mais situacional, construída sob
medida para a situação específica, aproveitando as experiências profissionais e
de vida dos educandos. Constrói-se, assim, passo a passo, com eles, a solução
para um determinado problema. A consequência é um compromisso muito mais forte
dos envolvidos, pois a solução partiu deles e da sua realidade. A solução e
suas ações são vistas como propriedade do grupo e não do professor.
A metodologia ainda propicia uma
profunda conscientização das pessoas envolvidas quanto a seus valores, missão
de vida e o desenvolvimento das chamadas habilidades sociais: ouvir, falar,
aconselhar, observar, negociar, decidir, perdoar etc.
É um trabalho na assim chamada
"oficina interna". É feito com muitas "vivências", seguidas
de reflexões individuais e "resgates" nos grupos em vez de discursos
e palestras intelectuais. Também são estimuladas atividades artísticas, como
pintura, modelagem e outras como suporte ao autoconhecimento. (Morgensztern,
1998)
SP
– Juventude
Aos
18 anos, saí de Além Paraíba e fui morar em SP para cursar psicologia. Já na
chegada me deparei com a impossibilidade de cursar psicologia, pois o curso
nas universidades públicas era em dois períodos e eu precisaria trabalhar
para me manter. Optei por fazer
Jornalismo, pois amava ler e escrever. Meu plano era fazer jornalismo,
arrumar um trabalho e depois fazer psicologia em uma faculdade particular,
onde o curso fosse apenas em um período. Já na faculdade decidi que
trabalharia na área cultural. Na primeira entrevista eu deveria levar meu CV.
E lá eu cheguei com meu “histórico escolar”. Sim, pessoas, eu não sabia o que
era um curriculum vitae. Não me falaram sobre isso no curso normal. A
pessoa que me entrevistou me explicou o que seria um currículo e eu cheguei à
conclusão de que não tinha aquilo, afinal, aquele seria meu primeiro emprego.
Então decidi que enviaria cartas, explicando quem eu era e o que eu pretendia
oferecer naquele trabalho. Mandei 5 cartas. Fui chamada para duas entrevistas.
Uma
dessas cartas foi para a Secretaria de Cultura do Estado de SP. A carta
provocou risos na secretária do Secretário de Cultura (foi ela mesma que,
mais tarde, me contou o que escrevo a seguir). Ela achou graça da
“ingenuidade” da carta, afinal, eles recebiam CV (aquele que eu nem sabia que
existia) diariamente. No instante em que ela ria e já se preparava para dar à
minha carta o destino da lixeira, o Secretário de Cultura, o então Rudá de
Andrade, filho do escritor Mário de Andrade, passou e indagou o motivo da
risada, e ela mostrou a carta. Ele leu e devolveu a carta para ela com a
orientação de que fosse entregue à pessoa responsável pela equipe de recepção
de um espaço de Cultura que seria inaugurado. Eu passei por essa entrevista e
fui aprovada. Esse foi meu primeiro trabalho. Iniciei na recepção e, três
meses depois, estava na equipe de produção. Em 1 ano, aos 21 eu já era
coordenadora adjunta do setor de produção de eventos e arte-educação e, aos
24 anos, fazia parte da equipe que iria implantar a primeira oficina cultural
em uma região de periferia. Aos 24 anos eu coordenava essa oficina,
implantada numa região com alto índice de criminalidade. Impossível relatar o
tamanho desse aprendizado. Mais tarde, o próprio Rudá me disse que, além da
carta estar bem redigida, a verdade das palavras fez com que ele me chamasse
para a entrevista. E foi essa verdade que eu carrego por onde passo.
Fiquei na Secretaria de Cultura por 8 anos...
afinal tinha um sonho a realizar...
---
No início do século XX, Rudolf Steiner fundou a Antroposofia,
do grego: "conhecimento do ser humano". A Antroposofia, segundo
definição da Sociedade Antroposófica, pode ser caracterizada como um método de
conhecimento da natureza do ser humano e do universo, que amplia o conhecimento
obtido pelo método científico convencional, bem como a sua aplicação em
praticamente todas as áreas da vida humana. Steiner trouxe para a razão as vivências
espirituais.
Em 1919, em Stuttgart, Alemanha, Rudolf
Steiner atendendo ao pedido dos proprietários da fábrica de cigarros Waldorf-Astória,
em criar uma escola para os filhos dos operários da fábrica, introduziu a
Pedagogia Waldorf. Distinguindo-se desde o início por ideais e métodos pedagógicos
até hoje revolucionários, ela cresceu continuamente, com interrupção durante a
2a. guerra mundial, e proibição no leste europeu até o fim dos regimes
comunistas. Hoje conta com mais de 1.000 escolas no mundo inteiro.
A Sociedade Antroposófica aponta,
como sendo uma das principais características da Pedagogia Waldorf, o seu
embasamento na concepção de desenvolvimento do ser humano, introduzida por
Rudolf Steiner. Essa concepção leva em conta as diferentes características das
crianças e adolescentes segundo sua idade aproximada. Trata-se de pedagogia
holística em um dos mais amplos sentidos que se pode dar a essa palavra quando
aplicada ao ser humano e à sua educação. De fato, ele é encarado do ponto de
vista físico, anímico e espiritual, e o desabrochar progressivo desses três
constituintes de sua organização é abordado diretamente na pedagogia.
Não há, basicamente, em nenhum
nível, uma educação que não seja a autoeducação. Toda educação é autoeducação e
nós, como professores e educadores, somos, em realidade, apenas o ambiente da
criança educando-se a si própria. Devemos criar o mais propício ambiente para
que a criança se eduque junto a nós, da maneira como ela precisa educar-se por
meio de seu destino interior. (Steiner, 1923)
Nós, professores, precisamos
passar pelo processo da autoeducação emocional, para que possamos estar
preparados para lidar com as dores de nossos alunos.
Um jeito de SER
Um dia ao abrir a gaveta da
geladeira, me deparei com uma batata que ali estava esquecida, por dias ou
semanas. Ao pegá-la me deparei com um broto. Era um broto pálido e branco, tão
diferente dos brotos produzidos quando a batata é plantada na terra. A gaveta
da geladeira apresentava as condições totalmente desfavoráveis para a
germinação, mas aquele broto lutava e insistia em viver. Ali, nunca
amadureceria, nunca realizaria seu verdadeiro potencial, mas desafiando as
probabilidades ele se desenvolvia e fazia valer sua forma de estar no mundo. “A
vida não entregaria os pontos mesmo que não pudesse florescer". (Rogers, 1983)
Quando trabalhava com crianças
portadoras do vírus HIV, nessa época ainda não existia o coquetel e o índice de
mortes em pessoas soropositivas era altíssimo, eu me lembrava desses brotos...
Aquelas crianças vivendo nas mais diversas situações desfavoráveis para seu
crescimento, institucionalizadas, hospitalizadas, muitas vezes em UTIs, lutavam
pela vida. O corpo frágil e pálido irradiava vida. Eram estralas brilhantes!
E assim somos nós... Cada um de nós carrega
dentro de si, a força vital da existência realizadora. “A tendência à autorrealização
é ativa no ser humano”. (Rogers, 1983)
Ao percorrer sua linha da vida,
entre em contato com essa força interior. Se reconecte com sua luz, traga seu
brilho para suas ações. Ao entrar em sua
sala de aula, ofereça as melhores condições para que os brotos possam
florescer... eles podem até parecer pálidos e sem vida, mas acredite, se você
der condições, eles se tornarão plantas.
“Ensinar é um exercício de
imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos
aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O professor, assim, não
morre jamais...” (Alves, 2000)
Referência bibliográfica:
Bos, L. Os caminhos para a
formação do Pedagogo Social.SP,2004.
Burkhard,G. Tomar a vida nas
próprias mãos.SP,2000.
(Morgensztern, 1998) – Artigo
publicado na página da Sociedade Antroposófica
Steiner, R. A Prática Pedagógica (São Paulo: Ed.
Antroposófica), palestra de 20/4/1923, GA 306
Quer compartilhar sua linha da
vida, entre em nosso grupo de professores.